Antes, ninguém tinha carro e as estradas raras; hoje, há muitos milhares, quase tantos como as famílias e tantas estradas que é mistério. Antes, quando o médico alemão saía em viagem de “estudo” (os médicos não tinham direito a férias), logo as almas caridosas rezavam, não fosse ficar por lá ou demorar muito e que o Senhor Santo Cristo nos livrasse de ser precisa alguma operação de emergência, tão poucos os operadores dum hospital com enfermarias medievais e quartos de pensão antiga. Todos juntavam dinheiro para doença, remédios e doutor. Hoje, briga-se no vasto, moderno e bem equipado hospital porque: “aquela passou à minha frente e não há direito!”, e a gaveta dos remédios está tão cheia que é pena ter que os pôr pró lixo. Antes, a cidade tinha 1 juiz e 1500 processos, um tribunal de trabalho com escassa meia dúzia de pendências e contavam-se pelos dedos da mão direita os do apoio judiciário. Hoje, há 5 juízes, 2 presidentes, 1 tribunal administrativo, um de contas, o de trabalho e mais de 20.000 processos (e estão sempre a entrar mais!). O Ministério Público tinha 1 magistrado, hoje anda pela dezena e os processos são 20 vezes mais. Consultas de graça aos milhares e processos apoiados outros tantos. Antes, havia meia dúzia de escolas, e uma e meia do secundário, e professores efectivos não chegavam a uma dúzia no Liceu e na Escola Industrial. Hoje, há tantas escolas (algumas com piscina aquecida) e Universidade e até já se fecham algumas por desnecessárias e os quadros têm professores com habilitação própria e dezenas de milhar de alunos com transportes subsidiados. Antes, havia raros telefones e ai de quem fizesse uma chamada para Lisboa que havia molho. Hoje, até as crianças têm 2 telefones cada, os pobres rendimento de reinserção, subsídio de desemprego prolongado e trocos para a droga que o que é preciso é viver agora. À rasca? Con certezamente.
Carlos Melo Bento
2011-03-14
Carlos Melo Bento
2011-03-14
Absurdos
Um preso, condenado a vários anos por crimes de natureza não divulgada, recusa-se a limpar a cela que, conspurcada com dejectos de toda a espécie, causa nojo aos companheiros de desdita, que reagem com greves de fome e quejandos. O director ouviu a psiquiatria que informou tratar-se de pessoa psiquicamente normal. Face a este parecer técnico, a autoridade prisional usou o regulamento e mandou empregar a força. Por causa das coisas, mandou filmar a operação, não fossem acusá-lo de ter violado a lei. Tudo certo e tudo errado. Para já, como pode ser normal um indivíduo que reage daquela maneira à prisão? Que tipo de psiquiatria temos que, perante uma anomalia gravíssima do comportamento humano, se atreve a considerar normal o que a comete? Que raio de medo o da autoridade prisional, que tem à sua guarda centenas de outros reclusos com comportamento normal, e não se insurge indignadamente contra um parecer pericial manifestamente incompetente e absurdo? Depois, porque usar a força bruta dos choques eléctricos contra um indivíduo que não se pode defender, quando uma boa mangueirada resolvia boa parte do problema? Que raio de medo legalista invadiu o país que um indivíduo fica morto em casa meses a fio porque quem deveria ter autoridade e coragem não tem um pingo de bravura para rebentar a porta e tentar ajudar um ser humano que pode estar em perigo e pode ser salvo? Nem os parentes? Custa a crer que foi este povo que se bateu em Aljubarrota e descobriu a Índia, depois de séculos de cobardia do resto da humanidade. Agora, um pobre miúdo que estuda numa secundária desta cidade, chora de pavor com medo de ir à escola para não ser espancado pelos que deviam ser seus amigos, tornando a escola no melhor tempo da sua vida? Um inquérito? Psicólogos? Reuniões? Isto precisa é de acção e daquilo que distingue os homens, dos do sexo oposto.
Carlos Melo Bento
2011-03-07
Carlos Melo Bento
2011-03-07
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