segunda-feira, 27 de abril de 2009

Democracia

Em 1974, para quem acreditava em Marcelo Caetano, sábio eminente, inteligência invulgar, professor e mestre respeitado, a revolução era impensável. A guerra do Ultramar com dezenas de milhares de rapazes por cuja segurança rezávamos, um império julgado irrenunciável, implicavam um atraso na restauração da democracia que se esperava do herdeiro de Salazar. Nos anos 50, dizia-se que o afastamento deste conduziria à guerra civil. Marcelo evitou-a e, esperava-se, iria conduzir-nos à democracia. Parece que sobre estimou os salazaristas e não teve azo de afastar Américo Tomás e os radicais de direita. Esse erro levou ao derrube do regime e à restauração da democracia pela força com fuga de cérebros e capitais (para Espanha e Brasil, principalmente), depois dum susto ditatorial comunistóide pelo meio. Mas a democracia foi restaurada e Mário Soares que a realizou empurrando-nos para a Europa com colossais benefícios, transformou-se no campeão do Portugal moderno, rico e progressivo como nunca. Nós, por cá, nunca conseguimos que a democracia atingisse o limite da vontade popular livremente expressa mas, ainda assim, conseguiu-se um ponto de equilíbrio que, se não recuar, certamente nos haverá de conduzir até onde os açorianos quiserem. O facto de poder publicar estas linhas prova porém que esta democracia superou o regime anterior também no campo das liberdades e aí tem de dar-se a mão à palmatória. Os pessimismos são injustificados: regime e Povo têm capacidade de sobreviver. A seu modo.
Carlos Melo Bento
2009-04-27

terça-feira, 7 de abril de 2009

Pai tirano?

A nossa autonomia como realidade e conceito político não é coisa fácil de entender na capital dum país onde a democracia tem poucas e fracas raízes. Servem de prova desta afirmação as posturas do insuspeito Jorge Sampaio cujos conceitos democráticos foram por ele praticados desde tenra idade e que, mesmo assim, acabou por concluir, contra toda a lógica democrática, que o crescimento da nossa autonomia tinha acabado, como se fosse possível a esta distância alguém prever quando é que uma instituição social pára de crescer, estagna ou morre. O presidente Cavaco Silva segue o mesmo raciocínio embora por outras vias, tentando até usar os seus deveres moderadores para pressionar o poder legislativo a desdizer o que disse no que foi a primeira atitude verdadeiramente democrática, em relação a nós que este poder tomou com alguma firmeza e constância desde 1974. O Povo Açoriano o quis, assim o teve. O actual Presidente não entende assim. Mas a autonomia é uma bolsa de liberdade e poder colectivo que a história e a geografia geraram e num corpo maior e que tem de ser respeitada senão a felicidade dos povos periga ou não se realiza. Só que o unitarismo estatal, versão nova do velho centralismo, não o consente e aquele, arrimado ao Tribunal Constitucional com quem mantém uma relação no mínimo estranha para um Tribunal, seduziu o Presidente, talvez esquecido dos que aqui votaram nele. Ou não? Um pai que quisesse manter o filho sempre criança, teria ainda assim direito a ser considerado bom pai?
Carlos Melo Bento
2009-04-07