sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Temos gente

É justo que se diga que todos se portaram bem perante a pavorosa tragédia que abalou a Madeira, matou gente como já se não via desde que a má sorte nos bateu à porta na Ribeira Quente, gerando amargura e dor que nós como povo irmão também sentimos. Foi consolador ver o Chefe de Estado solidarizar-se com o Povo Madeirense vítima inocente do dilúvio que sempre nos atormentou, abraçando o seu representante que às vezes o não tratou com a reverência a que tem direito o mais alto cargo do País. Encheu a alma escutar o Primeiro-ministro a pôr para trás das costas injúrias, infâmias, ataques pessoais inacreditáveis, e cumprir, do mais importante e poderoso lugar do País, a estrita obrigação de governar deslocando-se, contra ventos e marés, ao coração do desastre, incutindo alento e conforto àqueles que nem sempre o trataram como qualquer ser humano tem direito a ser tratado: com respeito. Alberto João Jardim, fanfarrão inteligente que nem sempre mede as palavras que profere como presidente de todos os madeirenses, deu a mão à palmatória, e fez justiça aos adversários da véspera, agradecendo-lhes a postura, a ajuda preciosa e animando o seu Povo com a ordem de celebrar a próxima Festa da Flor porque para nós ilhéus há sempre mais vida para além das tragédias. Admirável postura de estadista, que só se revela nas alturas próprias. E finalmente César que soube recuar com dignidade em direito indiscutível para ajudar um irmão em apuros. Há esperança. Temos gente. Sobreviveremos.
Carlos Melo Bento
2010-02-23
Amigos
Quem nosso filho beija nossa boca adoça, diz ditado antigo. Hoje, seguramente que nos havemos de guiar por princípios que serviram às gerações antigas, não havendo razões para pensar que não servem à nossa. Só é bom para nós quem deu provas disso. E o seu contrário também vale. Sousa d’ Oliveira acusava-nos de termos pouco espírito crítico, embora fossemos muito críticos, o que não é a mesma coisa. Criticar por criticar não leva a parte nenhuma. Não aceitar as verdades consabidas sem as submeter ao crivo da crítica ponderada em razões de experiência e de lógica, tem o mérito de não sermos marias que vão com as outras sem tarêlo e sem destino que certamente não levam a bom porto. Fazer política é conspirar, dizia o presidente Johnson (Conspiracy, conspiracy, conspiracy). Não espanta pois a conspiração. O que deve merecer o nosso repúdio é a conspiração contra nós. Venha ela de dentro ou de fora. Guterres e Sócrates são nossos amigos. É com eles que podemos contar porque com os outros já sabemos o que a casa gasta. E é nas ocasiões que se conhecem os amigos. Não é no afastar a má moeda que está o mal. Todos os de bom senso o fazem. Ainda não vi ninguém de categoria defender o tipo de jornalismo que era feito pela senhora afastada, quiçá por manobras de bastidor (quem as não faz?). Destilava ódio sem objectividade e sem nexo e era um péssimo exemplo para a sua classe. Ademais, mudar de general a meio da guerra costuma a ser mau. Mudar sem ter garantias de melhorar, é suicídio.
Carlos Melo Bento
2010-02-15

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Tréguas e vexames

A guerra entre a comunicação social e a mais poderosa figura do Estado, o primeiro-ministro (o Presidente nomeia-o ou demite-o mas não governa) não augura nada de bom. Como aquela alimenta a opinião pública que escolhe os primeiros-ministros, percebia-se que ganhasse a CS. Mas isso não é líquido porque o executivo tem a força que os media nunca terão. Eles moldam o objecto, mas quem o faz é quem governa. John Mayor, jornalista, foi primeiro-ministro e pagou o atrevimento…Está o País em encruzilhada perigosa; o bom senso dita que se guardem tréguas até a tempestade passar. Infelizmente, o desvario histérico leva à criação de casos em cima de casos para o tira-te para eu me pôr que já se adivinhava quando o PS perdeu a maioria. Penso que o governo Sócrates pode cair, só não sei é se o País cairá com ele. A maioria espúria que se formou para alterar a Lei das Finanças Regionais que, por uma vez, nos fazia justiça, permite pensar que as Oposições não terão escrúpulos em unir-se (apesar dos abismos políticos que as separam) para tentarem subir ao poder. Esperam-nos tempos difíceis e não foi agradável ver-nos desunidos quando até os socialistas madeirenses se uniram contra nós. César está certo: não há disciplina partidária que justifique procedimentos anti açoreanos. As urnas falarão. Entretanto, dêem transporte ao mutilado de guerra Gilberto Sousa. Poupem-nos o vexame de o ver rastejar na rua sem as pernas que o amor à Pátria lhe roubou na juventude.
Carlos Melo Bento
2010-02-09

Duas faces

Custa ouvir que não vale a pena uma crise política por causa da lei das finanças regionais e custa mais ainda o riso escarninho e de desdém com que isso é dito por pessoas de alto saber e grossas reformas. O orçamento, a pesada dívida gerada por políticas sempre rigorosas e criteriosas, os défices gigantescos filhos desses mesmos cuidados e tudo com que nos massacram diariamente os políticos, isso vale a pena e é importante e merece uma boa crise. Lá as regiões ditas autónomas nem pensar. Têm um território quase igual ao Algarve, meio milhão e tal de habitantes residentes e quatro vezes isso emigrado mas não, uma crise por sua causa seria impensável. Registe-se para os devidos efeitos para memória futura que a do povo ilhéu é por natureza fraca. Navegando em favorável conjuntura, por acaso, o vento corre a nosso favor. O vento e os argumentos, que nove é mais difícil que uma e meia. Bem tentam os madeirenses virar o cata-ventos mas sem sucesso que o primeiro-ministro não deixa. E qualquer solução que este triste diferendo possa merecer deveria ter em conta não apenas esta conjuntura mas esta e as futuras que tudo muda e quem boa cama fizer nela se há-de deitar. E a boa cama quer-me parecer seria unirmo-nos contra a ambição desmedida de quem se esteve nas tintas para o abandono a que votaram os que tudo arriscam por terem de suportar uma base que confere importância e muito dinheiro ao todo. A solidariedade é moeda de duas faces e quando tenha de ter uma só, que seja a nossa.
Carlos Melo Bento
2010-02-02